Chrysti – Capítulo 3
Um mês se passou após a morte de minha mãe, meu pai começou a beber. Não suportava mais a dor da falta de sua amada. E eu? Como fico?
Voltei às aulas, não ia muito bem em matemática, não conseguia entender nada das equações que era ensinado. Já estava com quase 11 anos e minha cabeça não funcionava muito bem. Sempre tendo pesadelos com o monstro e a lembrança da minha mãe, agora meu pai virou um viciado, eu nem tenho comida descente para me alimentar, vivo de leite ou macarrão sem molho, é a única coisa que sei fazer. Quando sinto fome, faço um macarrão simples apenas cozido em água e sal, coloco um pouco de azeite depois de pronto e me alimento, ou então um belo copo de leite morno com o que tiver na dispensa para dar uma cor ou sabor. Se não tiver nada, bebo apenas leite morno.
Fui para o colégio, era dia de prova, eu até que estava animada, porque era prova deeducação física, tínhamos formado um time de futebol feminino, eu gostava bastante. Fui para o vestiário e para minha surpresa minha primeira regra veio. E agora? O que eu faço? Uma colega me ajudou e assim consegui participar da prova sem maiores problemas.
Agora eu era uma mulher, com corpo de mulher, sofrimento de mulher, mais desejo de menina, queria apenas ser feliz…
***
O ano letivo acabou e desta vez pude ir até a casa de meus avôs passar o fim de ano com eles. Parecia tudo normal, quando recebemos a noticia de que meu pai havia passado mal. Meus avôs me levaram até o hospital para eu ver o meu pai, já era tarde.
O médico me chamou e me disse:
- Minha filha, fizemos de tudo, mais seu pai teve uma parada cardíaca por causa da bebida e veio a óbito.
- Vó o que eu faço agora? Não tenho ninguém.
Fiquei desesperada, sozinha nesse mundo de meu Deus…sem a mãe, sem o pai, meus avós já eram de idade, não saberiam cuidar de mim… ( choro ).
Fiquei então duas semanas na casa deles, eles moravam em um sítio também distante da cidade, então eu não tinha como ir ao colégio. Resolveram que eu iria morar com minha tia. Ela era sozinha, não tinha marido nem filhos, era irmã da minha mãe. Quando eu era pequena gostava muito dela por causa dos bombons que me trazia, mais ela tinha cheiro de uísque.
Arrumei minhas coisas e fui até a casa dela, fiquei num quarto bem bonito, com um papel de parede rosa, e uma escrivaninha de madeira escura. Tinha um quadro de bailarina na parede, e uma janela que dava para a rua, onde eu podia ver todo mundo passar.
Voltei a freqüentar a escola, sete meses se passaram e descobri que morar com a minha tia não era legal, porque ela bebia tanto quanto meu pai. Ela não cuidava muito de mim, eu quem fazia a comida, lavava a minha roupa e limpava a casa. Eu não sabia cozinhar muito bem, era bem mais fácil fazer um copo de leite ou macarrão sem molho. Às vezes eu fazia bolinho de chuva com suco de limão. Eu gostava de comer o bolinho assistindo televisão, mas quando ela chegava em casa tinha que desligar tudo e ir para o meu quarto, senão ela brigava e ficava falando o tempo todo, coisas que eu não entendia, parecia que falava com o além, ela mesmo falava e respondia como se alguém estivesse com ela. Eu nunca entendi isso.
Todos os dias ela me buscava na escola, mas nesse dia ela não foi, tinha uma entrevista de emprego e não podia faltar. Não sei se iria passar nessa entrevista, na noite anterior havia bebido tanto que seu cheiro estava insuportável…
O sinal tocou e quando saí do prédio escolar, encontrei o monstro na porta me esperando. Com aquele olhar de lobo querendo me devorar, igual aos meus pesadelos. Ele veio até mim, não entendo como sabia que minha tia não viria.
- Vim te buscar, disse o monstro.
-Como sabe que estou sozinha, minha tia está me esperando…
-Todos os dias eu te espero e hoje sei que ela não vem.
-Eu não vou com você, não pode mais fazer nada contra minha mãe e nem contra meu pai.
- Posso matar você se não vier ou se abrir a boca para alguém.
Mais uma vez o monstro me colocou no carro, por ser conhecido de todos, e saberem que ele era amigo do meu pai, ninguém achava estranho, e eu não tinha como gritar. Novamente o desespero tomou conta da minha alma. Me sentia indo para o matadouro, uma menina completamente desesperada e sem saber o que fazer! Tinha vontade de fazer ele sumir de perto de mim, mas não sabia como…
Aquele dia foi um dos piores dias da minha vida. Ele me destruiu por inteiro. O monstro com cheiro de pobre e o cheiro daquela casa fedida estavam de novo em mim. Agora meu ódio por ele era um milhão de vezes maior. Eu só pensava que quando eu crescesse iria matá-lo.
Tentei falar para minha tia, mas ela estava tão bêbada quando chegou em casa que mal sabia o caminho do seu quarto.
Novamente eu estava sozinha, ou quase sozinha…
Um comentário:
Nossa muito forte
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